Análise crítica acerca do trabalho “Tramazul”de Regina Silveira

Análise crítica acerca do trabalho "Tramazul" de Regina Silveira
janeiro - 2011

Viviane Mattos Nicoletti - Artes Visuais / Desenho Industrial


Fotografia disponível no site do MASP


O site specific de Regina Silveira, “Tramazul” (2010), que ocupa a fachada do MASP, consiste em adesivos colados sobre as janelas do museu, que formam uma imagem de um céu bordado em ponto cruz. Ouvi críticas fortíssimas por que a artista utilizou elementos, o bordado e a agulha, que estão diretamente ligados à imagem social da mulher, e revelam uma posição de submissão, daquela que estava limitada a afazeres domésticos.

Mas artista que é artista, não dá ponto sem nó.

A obra reúne diversos elementos utilizados pela artista no decorrer de sua carreira. Como a malha geométrica presente no começo da década de 1970 ou a utilização de cartões postais turísticos na série “Brasil Today: Natural Beauties” de 1977, o tema do céu também já foi explorado pela artista na obra “Mil e um dias”em 2007 que projetou a imagem do céu numa porta, e na obra “Entrecéu” também de 2007, ou ainda pela relação com a arquitetura, presente cada vez mais, nas obras de Regina Silveira.

Mas vejo um diálogo muito expressivo com a série “Armarinhos”de 2002/03, em que objetos de costura como botões, carretéis e alfinetes são projetados com suas respectivas sombras, de tal maneira que formam figuras repressoras ou que agridam o feminino como a sombra das linhas que formam laços unidos por um nó ou um alfinete que projeta uma sombra que se assemelha a um objeto de tortura, ou no mínimo à um fórceps, que também é um instrumento um tanto quanto agressivo à mulher ou à criança.



“Alfinete” da serie” Armarinhos” de 2003


A mesma agulha que compõe a série “Armarinhos” se repete na obra “Tramazul”. Assim, não vejo que o bordado esteja no MASP de maneira ingênua, submetendo o feminino. Vejo que Regina Silveira quando coloca um símbolo dessa submissão feminina de forma natural, reflete criticamente os gestos da sociedade brasileira que coloca a mulher, social e moralmente submetidas, exatamente dessa forma.

Percebo que esse paralelo se estabelece, não só com o feminino, mas com outros pontos de tensão. A obra mostra um céu limpo de poluição e azul, bem diferente daquele que deveria refletir na fachada do museu. Regina também opta por não refletir os prédios vizinhos, longe do caos urbano ou como se a Avenida Paulista estivesse longe dos problemas de especulação imobiliária da cidade de São Paulo.

O fato de “vestir” o MASP com um bordado bonito, também pode refletir o descaso que se tem com a má administração do Museu há anos. Como se a má gestão e todos os outros problemas que há no museu, pudessem ser escondidos embaixo de um belo tecido bordado a mão.

Um comentário:

Anônimo disse...

Grande alfinetada social...
Texto lindo, ótimos trocadilhos...